O verdadeiro terror é a história colonial. Black as Night traz uma narrativa repleta de questões sociais e raciais interessantes, abrilhantadas pelo protagonismo divertido de Asjha Cooper, porém, tudo fica ~too much quando o roteiro e a direção não parecem conseguir escolher um caminho, e o filme patina numa história e estética que não tomou decisões importantes.
Esse tinha tudo para ser mais um verão qualquer na vida de Shawna (Asjha Cooper), porém, segundo a própria, ele mudou a sua vida de maneiras inimagináveis. Ser adolescente já é algo bem complicado, ainda mais quando se enfrenta problemas de autoestima. No calor infernal de New Orleans, observamos a protagonista e seu melhor amigo aproveitando o melhor do verão, ou melhor, apenas ele: Shawna está com o corpo coberto pois evita qualquer contato com o Sol, já que não quer ficar “mais negra”. E assim já é nos introduzido o primeiro assunto: colorismo.
Além dessa questão na vida da jovem, reforçada de forma babaca pelo irmão, a acompanhamos entrando num edifício um tanto quanto esquisito. O Ombreux está caindo aos pedaços: é um local para viciados e traficantes em vias de ser demolido em prol da gentrificação do bairro – mais um tópico pincelado pelo longa. Infelizmente, descobrimos que ali mora a mãe de Shawna, que cedeu ao vício e foi embora de casa.
Mesmo antes dos vampiros entrarem na história, a vida de Shawna já era assombrada por questões pesadas demais para uma jovem de 15 anos lidar. Porém, os vampiros aparecem mesmo assim, em uma noite na qual a menina (doidinha, diga-se de passagem) sai caminhando sozinha pelas ruas do bairro, depois de ter passado um constrangimento diante do crush.
A motivação que leva Shawna a lutar contra vampiros é legítima, identificável e plausível dentro do contexto criado. O primeiro ato de Black as Night é divertido e, apesar de introduzir muitos elementos, parece que irá conseguir balanceá-los e seguir pelo caminho óbvio, mas desejável: uma aventura teen bizarra de verão lutando contra vampiros. No entanto, não é isso que acontece.
O roteiro de Sherman Payne parece não conseguir se decidir onde, realmente, o horror reside, e a todo momento novas pautas vão sendo introduzidas e facilmente resolvidas. Apesar de apresentar temas muito pertinentes, ao final, temos resoluções demasiadamente simplórias para problemas complexos – inclusive a questão do colorismo vivenciado por Shawna.

As conexões entre os temas e a construção geral são criativas e claramente foram bem pesquisadas, porém, o curto tempo do filme fez tanto o desenvolvimento dos tópicos quanto dos personagens serem apressados e repentinos. Isso quebra o engajamento com a história que, dado a quantidade de assuntos apresentados, funcionaria melhor como série. Nesse sentido, Payne precisaria deixar de lado alguns assuntos e aprofundar em apenas um deles.
Essa falta de clareza sobre a verdadeira identidade e tema da história impacta a direção. A estreia de Maritte Lee Go é ótima e ela proporciona sequências boas, como a do apartamento da mãe de Shawna ou a da briga que a protagonista e seus amigos tem com um vampiro no Ombreux. No entanto, a diretora parece não decidir qual será o tom da narrativa, que transita de forma pouco orgânica entre a paródia com filmes de vampiros, jumpscares ineficazes, sátira relacionada aos papéis negros nos filmes de terror, aventura adolescente e a densidade dos assuntos que resolve abordar. Infelizmente, o ritmo oscila e o longa carece de uma diretriz única que envolva todos os elementos.
Ao pensarmos no título e nas primeiras cenas, acredito que a abordagem do colorismo deveria ter sido melhor trabalhada e careceu de um aprofundamento que a própria personagem pedia. É um tema importante, que cria densidade e reverbera dentro da comunidade negra, pouco explorado e que poderia se beneficiar do gênero do terror, especialmente quando pensamos sob o ponto de vista de um adolescente que tem a autoestima impactada com isso.
Ao olharmos o todo, os vampiros se tornam a parte mais irrelevante no conteúdo da história, uma distração entediante e que sobra no meio de outros contextos mais complexos e interessantes – particularmente, eu preferia uma abordagem maior no tema gentrificação pós furacão Katrina (quem lembra? Pois é) do que os vazios questionamento a cerca de “como vampiros morrem”, pensados para serem alívios cômicos, mas que apenas quebram o engajamento com a narrativa.

Asjha Cooper e Fabrizio Guido (o melhor amigo) possuem uma química incrível e entregam interpretações divertidas, e, justamente por isso, poderiam ter sido melhor explorados se o roteiro não estivesse tão enrijecido e inflado.
Como um lançamento da antologia filmíca Welcome to the Blumhouse, parceria entre a produtora e a Amazon Prime Video, faltou halloween e sobrou temas importantes, mas com o aprofundamento de uma conta de instagram.
Apesar dos comentários negativos, Black as Night é um ótimo debut para a diretora Maritte Lee Go, de origem Filipina. Essa é uma história que começa um diálogo importante e dá voz ao protagonismo negro, criando heroínas dentro da comunidade como é Shawna, valorizando a sua cultura e denunciando que, dentro das tragédias naturais como foi o Katrina, a população negra e marginalizada é sempre a que sofre mais, sendo expulsa da própria comunidade.
Black as Night é uma ótima opção para você apoiar filmes com representatividade dentro e fora das telas e com algo a dizer além das temáticas padrões. Só não busque muito aprofundamento nos temas, apenas divirta-se nessa aventura vampiresca.
