De Volta a Itália carece de autenticidade e se apoia em carismas

Os paralelos por trás de Made in Italy são mais interessantes do que o próprio filme. A estreia do ator veterano James D’Arcy como roteirista e diretor é genérica e segura, com uma narrativa conveniente e emotiva que embala uma sessão pipoca de domingo a tarde. O carisma de Liam Neeson e a Toscana como plano de fundo seguram uma história sensível, mas exaustivamente previsível.

Jack, diretor de galeria de arte, parece amar o que faz, e o faz muito bem, até sua ex-esposa, dona da galeria onde trabalha, anunciar que sua família pretende vender o local. Desesperado, o rapaz decide que é hora de vender a antiga villa da família na Toscana e conseguir o dinheiro para comprar o espaço, só precisa convencer uma pessoa: seu pai. Ausente e distante do filho, Robert já foi um pintor renomado, mas hoje vive uma vida boêmia e deprimente. Os dois embarcam rumo a casa italiana, que não visitam há décadas – o filho está determinado a reformá-la e vender, o pai está perdido em memórias e sentimentos.

Pai e filho Liam Neeson e Micheál Richardson reprisam o papel da vida real numa história que, finalmente, os força a lavar a roupa suja e viver o luto da perda da esposa/mãe, que morreu há quase 20 anos. O duro paralelo entre os personagens e o atores é a tragédia similar que compartilham: Natasha Richardson, esposa e mãe, morreu num trágico acidente de ski em 2009. O ponto de vista quase autobiográfico confere uma camada extra de melancolia pintada com o colorido suave do verão italiano.

O luto é o preço do amor (que perdura), e atravessar esse corretor solitário e sombrio é um grande desafio, mas que precisa ser feito – interromper o processo de luto é não se permitir sair dessa dor, e não criar espaço para ressignificar a vida com aquela ausência. A consequência de um luto mal digerido é a inexistente relação de pai e filho, na qual este ressente a ausência da figura paterna, ao mesmo tempo que a busca o tempo todo.

O roteiro é superficial e de uma previsibilidade entediante. Robert e Jack são completamente diferentes, enquanto o pai charmoso, ~easygoing e emocionalmente distante, Jack é romântico, sensível e ressentido. A dinâmica da dupla segue entre alívios cômicos e cutucadas amargas até o grande climax dramático, sobrecarregado de melodrama e desarmonia entre os atores. Liam Neeson é um ator excelente e brilha quando sair da zona de conforto (ex-policial traumatizado), sem sua vontade de extrair leite de pedra, o filme definharia. Jack chega a comentar que não é tão talentoso quanto o pai pintor, e o roteiro parece desejar transpor isso para a vida real, oferecendo a Micheál um protagonista insonso e sem personalidade.

A falta de aprofundamento se estende a todas as esferas da história. James D’Arcy escreveu personagens femininas unidimensionais utilizadas para fazer os homens se movimentarem dentro da narrativa. Natalia, vivida pela lindissima Valeria Bilello, é revestida de falsa complexidade, que não se sustenta além de diálogos curtos e introdutórios. Lindsay Duncan dá vida a uma agente imobiliária que rouba todas as cenas que aparece, e nos desperta mais interesse em acompanhar um spin-off da sua vida do que terminar o filme. As ações das duas levam a um show de conveniências que o roteiro não tenta sequer disfarçar.

Não é difícil nos conquistar com uma fotografia que contempla a Toscana ao fundo. O destaque positivo de De Volta a Itália fica com o design de produção, oferecendo locações lindas e investindo nas pinturas de Robert – só que o roteiro aparece de novo para ser um CHATO e querer nos ensinar sobre arte e verbalizar o que não precisava, até no trailer ele tem essa mania. A paleta de cores é encantadora, assim como a forma que aproveitam a luz e constroem os cenário. Faltou deixar a audiência contemplar tudo aquilo um pouquinho, dar tempo de assentar os sentimentos.

Tal qual seu roteiro, a direção de James D’Arcy é genérica e quase ausente. Temos a sensação de estar assistindo ao reprise de uma série de filmes. Consigo ver Elio e Oliver jantando no restaurante de Natalia; Claire, Sophie e Charlie visitando a villa atrás do amor de anos atrás; ou o recomeço inesperado de Frances Mayes. Enfim, americanos e britânicos fazem da Itália um destino para o autoconhecimento, o perdão e o recomeço – o que soa incrivelmente clichê, mas aceitaria viver hoje mesmo. Talvez todos nós precisemos de uma viagem catártica para a Toscana.

De Volta a Itália é um filme confortável, gostosinho para assistir domingo a tarde, e é sempre um prazer acompanhar a região sul da península itálica no verão, com suas paisagens lindas e comidas apetitosas. O teor quase autobiográfico carrega o drama, mas não é o suficiente para nos colocar investidos numa história fofa que já sabemos o final. Para um filme que fala sobre arte, no berço renascentistas e com toda sua bagagem cinematográfica, De Volta a Itália soa como um potencial desperdiçado por alguém que ficou preso a superfície do Daddy’s Issue e não observou o germinar de possíveis outras abordagens.

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