Lara Jean está de volta! A aventura da descendente de sul-coreanos continua com suas atrapalhadas, inexperiências e paixões platônicas. No entanto, continuações são sempre um assunto delicado, tem muitas expectativas para serem manejadas e incertezas diante do futuro. PS Ainda Amo Você chega na Netflix após o sucesso estrondoso de Para Todos Garotos que Já Amei, e o streaming responsável por reavivar os filmes teens consegue se manter fiel ao antecessor, mas leal demais aos fãs para ousar mexer em qualquer coisa.
O novo filme começa imediatamente após o anterior – atenção, se não assistiu à Para Todos Garotos que Já Amei, o que é basicamente um crime contra a humanidade, pare de ler agora, pois contém spoilers!
Lara Jean e Peter Kavinsky são o casal mais fofo da atualidade, só que a forma como toda essa história de amor aconteceu foi meio conturbada, por isso nossa heroína precisava de um primeiro encontro de verdade. Apaixonadíssima por Peter (como seria impossível não ser), tudo está bem na vida de Lara Jean, até ela receber uma carta-resposta de John Ambrose – sim, esse tormento não acabou em sua vida. Mais perto do que ela poderia imaginar, a reaproximação do crush da infância somada as inseguranças de se envolver com alguém experiente abalam a vida da colegial, que tem novos dramas para lidar.
PS Ainda Amo Você é a perfeita continuação de Para Todos Garotos (…) e segue exatamente a fórmula do anterior – o que acabou decepcionando um pouco. Lara Jean e Peter continuam extremamente adoráveis, mas suas personalidades e experiências diferentes são o principal fator de discórdia entre o casal, que precisa aprender a lidar um com o outro. Para Todos Garotos é uma franquia incrível pois mostra o relacionamento adolescente de forma saudável, leve e sem estereótipos problemáticos. O longa mostra que é possível construir uma narrativa na qual as pessoas “não populares” não são excluídas, vítimas de bullying, os esquisitos e coisas do gênero, são apenas tímidos, mais fechados, e tá tudo bem!
A forma como a história lida com o relacionamento de Lara Jean e Peter é saudável, honesta e sensível, especialmente dentro de um gênero narrativo com histórico problemático como filmes teens. Eu amo que a protagonista não muda em nada o seu jeito de ser e nem tenta agradar ao Peter – apesar de óbvio, frequentemente vemos histórias nas quais as meninas se transformam por namorarem o garoto popular. E o inverso também é verdadeiro – Peter continua popular, praticando esportes e os objetivos e planos diferentes dos dois se mantem. Chato estar surpresa por retratar um relacionamento adolescente de forma saudável e normal? Um pouco, mas Lara Jean é a heroína do gênero que carecíamos e encabeça essa mudança e renascimento dos filmes teens como um exemplo positivo de mudança.
Outro ponto muito legal do filme é que os dois vacilam dentro do relacionamento. São erros claros de pessoas inexperientes e inseguranças, como são os adolescentes, e isso deixa nosso coração quentinho e desesperado ao mesmo tempo. A ingenuidade de Para Todos Garotos é um charme que souberam manter intocado e a banalidade das situações mostram que, quando bem trabalhadas, histórias simples e banais se tornam grandiosas e capazes de prender o público. O sentimento e intensidade típica da idade extrapola a tela e eu, que há um tempinho (zinho) não sou mais adolescente, senti tudo que a protagonista estava passando, entendia seus dilemas e dramas. Apesar de teen, Para Todos Garotos é uma narrativa que trata relacionamento de forma verdadeira e muito madura.
John Ambrose, o culpado por balançar meu ship Lara Jean + Peter é um fofo. Lembra da cena pós crédito do primeiro filme? Esquece, pois os produtores esqueceram completamente e a história funciona como se ela nunca tivesse existido haha. Parte do motivo é a mudança do ator que vive John Ambrose, agora sendo Jordan Fisher. Na época do anúncio de tal alteração, iniciou-se uma revolta online pelo ator ser negro (e, no livro, aparentemente é loiro etc), baboseiras logo silenciadas. É impossível não se dividir por John Ambrose, e, Lara Jean, a gente te entende completamente! Jordan Fisher é um amor, charmoso e que chega para desafiar o relacionamento dos principais, de uma forma ingênua e despretensiosa.
Porém, esse plot evidencia um problema maior de narrativa. Não posso avalia-lo como adaptação uma vez que não li os livros, mas, ainda no sentido estrito da palavra adaptação, algumas questões poderiam ter sido melhor trabalhadas. O filme foca demais em Lara Jean e Peter e, mesmo que essa seja a questão central, ele abre pontas na história que não procura fechar ou se aprofundar nelas. O problema é maior quando isso não acontece com um subnúcleo, mas com quatro (sim, tudo isso).
Eu queria ter conhecido melhor John Ambrose, para que pudesse me apaixonar por ele e ficar, de fato, dividida entre ele e o Peter – mas em momento algum eu cheguei a torcer por ele. A verdade é que ele nunca foi uma ameaça real ao casal Covey e Kavinsky, e isso perde a força do longa. Não é culpa do ator, mas de uma narrativa que, desde o começo, não queria que Lara Jean e John Ambrose acontecesse. Amo que não vivemos um triângulo amoroso, ninguém aguenta mais isso, porém podíamos ter conhecido melhor o novo personagem para além das memórias com a protagonista.
Esse foco excessivo em Lara Jean prejudica outras narrativas, como a relação com a família e amigos. No livro, como estamos dentro da cabeça da personagem, viver exclusivamente seus dramas funciona, mas, quando adaptado para filme, algumas coisinhas precisam ser ajustadas. Lucas deu esse toque na Lara Jean, que servia para todo o filme, mas parece que nem a personagem e nem as roteiristas pegaram. Eu queria conhecer melhor a Chris, vê-la falando das novas aventuras, um momento fofoquinha das migas. O mesmo com a família Covey, Kitty ficou apagada, basicamente vivendo do romance alheio, e tudo ao redor de Lara Jean é novo, introduzido correndo e mal explorado. Por fim, Gen, a ex de Peter – e também ex melhor amiga de Lara Jean. As duas tem um momento, que é o máximo, mas que poderia ter sido muito mais profundo e melhor construído. Enquanto Para Todos Garotos acerta na forma de lidar com relacionamentos amorosos, ainda escorrega demais no universo das amizades femininas.
Amei Stormy, vivida pela maravilhosa Holland Taylor! A personagem dá um tempero na história, mas faltou criar um laço genuíno com a Lara Jean, e que serviria muito bem para inserir a Margot na história – que fica sobrevoando a amizade das duas.
Talvez tudo isso seja muito para um filme teen curto e despretensioso? Sim, então a dona Netflix poderia transformar essa trilogia numa série, ou não introduzir tantos temas e não termos vários personagens orelha de Lara Jean rs. Isso não faz com que a experiência de PS Ainda Amo Você seja ruim, longe disso, inclusive já quero reassistir. O ponto é que a experiência é idêntica à do primeiro, e por tudo se repetir, parece que não saímos do lugar ao final do longa. Achei, sim, que faltou ousar e arrancar o coração dos fãs, deixar-nos sedentos para o próximo (que já está confirmado), ao invés de apenas animados com uma história que não tem gancho. Entregar exatamente o que o telespectador quer não é uma estratégia sustentável, já que histórias vivem de pontos de flexão e arcos que necessitam sofrer transformações.
Voltando a fase elogios, Para Todos Garotos continua com a estética impecável. O roteiro é cheio de metáforas (óbvias) que são bem trabalhadas no arco dos protagonistas, deixando o macro da história todo fechadinho. O quarto de Lara Jean continua a bagunça maravilhosa, e seus lookinhos ainda são tudo, e muito bem pensados já que refletem completamente o estado de espírito da personagem – presta atenção no mood dela e nas escolhas de roupa. A trilha sonora é excelente, como no primeiro filme, com músicas que encaixam muito bem com a atmosfera do filme, escolhas estéticas e também com a vibe dos personagens. Para Todos Garotos trabalha muito bem os detalhes e promove um filme cheio de personalidade, com identidade própria e uma linha conceitual bem definida – e isso é uma das coisas que mais gosto nele. A direção explora muito bem as fantasias da Lara Jean e isso é refletido em cenas que passa exatamente o que a personagem está sentido de forma divertida.
PS Ainda Amo Você é uma continuação perfeita de Para Todos Garotos. O filme ainda deixa nosso coração apertado com o misto de fofura excessiva e desespero pelo ship Covey e Kavinsky. A menina dos olhos da Netflix, sem dúvidas, mantém a coroa de melhor filme teen do reboot do gênero promovido pelo streaming, mostrando que é possível construir narrativas amorosas nas quais os relacionamentos são saudáveis e os personagens diversos. Lara Jean é uma protagonista muito especial e eu amo que ela se manteve fiel a sua personalidade, continua a mesma pessoa por quem nos apaixonamos. Porém, como ela mesma nos ensinou, zona de conforto não é bom para ninguém, e PS Ainda Amo Você joga muito no seguro e perde a oportunidade de surpreender os fãs e deixá-los enlouquecidos. Temos mais um filme, o último e, infelizmente, zero pistas de como será essa aventura.
PS: E o Josh? Pois é, esquecido no churrasco, será que é assim nos livros também?