Nova York é um símbolo, cidade cosmopolita, centro do capitalismo, cheio de pessoas de vários cantos do planeta, com histórias, convicções e vidas muito diferentes. É o verdadeiro caos da pluralidade humana e, também, um lugar onde o amor acontece. Modern Love, a nova série original da Amazon Prime Video é sobre a tempestade que o amor faz na vida das pessoas – como diria Lulu Santos, toda forma de amor.
Eu sempre quis conhecer Nova York, andar por cada avenida numerada, entrar numa pizzaria feia e deliciosa, olhar para cima e ver o Empire State e tomar um Starbucks passeando pelo Central Park. São tantas referências, filmes, livros, vlogs que sinto como se a conhecesse e, ao mesmo tempo, esse cenário sempre traz um olhar diferente. Uma história que se passa em Nova York toca meu coração, mas quando essas histórias são reais, a coisa fica muito mais pessoal.
Modern Love é baseado em ensaios publicados pelo The New York Times que retratava histórias de amor plurais que tinham a cidade como pano de fundo. Muita coisa foi ficcionada, mas a essência de cada aventura está ali, pois fica claro a pessoalidade, o carinho e, principalmente, a imprevisibilidade de cada história – é a vida real acontecendo. A série é uma antologia de 8 episódios com apenas e precisos 30 minutos de duração cada.
Eu sou apaixonada por antologias pois elas são, basicamente, contos do audiovisual. Se fosse criar uma representação de Modern Love, seria uma mistura de Room 104 e Noite de Ano Novo. Cada episódio acompanhamos uma jornada diferente e, apesar de todos se tratarem de amor, nem sempre ele é o romântico. São histórias curtas, mas repletas de sentimento, de complexidades emocionais, de momentos que conseguem arrancar lágrimas (de uma pessoa de coração gelado como eu). A gente sorri ao final de cada episódio, e a série acerta em não dar uma conclusão utópica, pois, como na vida, a história tem o final que a gente precisa – é bem mais do que ficar junto ou não, é sobre nós mesmo. O sorriso é a melancolia aliviada de uma inevitável compreensão de uma história essencialmente real.
Assistir a cada episódio de Modern Love foi como ver cada amor tomando forma, e dá quase para tocar esse sentimento. Nova York ficou ofuscada diante de histórias tão especiais como a garota que encontra apoio familiar no porteiro do prédio, ou a menina que perdeu o pai e procura uma figura para assumir esse posto. A gente se envolve com cada conto logo no começo, com cada pessoa cuja vida entramos de surpresa, onde tudo já está acontecendo e continuará, porém de uma forma diferente.
Prime Video investiu pesado no elenco da série e, não à toa, a magia de cada história depende, claro, dos seus protagonistas. Dev Patel (a.k.a. crush insuperável que tenho) vive um nerd CEO de uma empresa de aplicativo de namoro, e apresenta a contradição da sua criação com sua história de amor. Tina Fey e John Slattery são um casal que a única coisa que os mantém conectados são os filhos. A minha história preferida foi estrelada por Anne Hathaway: contar qualquer coisa seria spoiler, mas a maneira sensível que lidam com o tema e a precisão empática que dão ao sentimento de Lexi é perfeito! O elenco tem ainda Andrew Scott, Julia Garner, Andy Garcia, Sofia Boutella (um dos meus eps favoritos também), Catherine Keener e, até, um olá de Ed Sheeran!!
A produção da série tem todo um ar romântico hipster e, para isso, fico grata que nenhuma história envolva um cara de wall street e a maioria dos casos sejam de pessoas desengonçadas, de humanas, cheio de problemas comuns, gente boa – enfim, humanos que dão uns vacilos, mas são fofos, como acredito ser o caso da maioria das pessoas.
A trilha sonora se encaixa muito com a vibe da série. Ao final de cada episódio, uma música diferente enlaça todo o sentimento, deixando o expectador meio contemplativo vendo os créditos. A fotografia é linda e, ao contrário das outras antologias, eu gosto de como essa mantém a linguagem apesar das diferentes histórias. Uma coisa ou outra se adapta ao episódio, mas no geral todos seguem a mesma linha estética e narrativa.
Amadurecer é morder a língua todo dia, ou simplesmente mudar de opinião sobre as coisas. Eu nunca gostei de crônicas, de texto muito sentimentais, de poesia nas palavras, mas isso vem mudando e Modern Love é o soco do nocaute final nessa crença boba – agora, eu amo. Isso porque o material embasado da série, a coluna no The New York Times é, em essência, formada por crônicas – com uma pitada de conto, mas venho a aprender que os dois andam de mãos dadas. E, ainda no momento analogias, lanço mais uma para convencer você: enquanto as longas narrativas ganham a luta por pontos, os contos ou antologias nos vencem por nocaute.
O último episódio merece um tempo para ser assistido. O que quero dizer é: se for maratonar, deixa o último para ver um pouco depois, pois ele é o encerramento, e tem exatamente essa cara. Eu maratonei, são 4 horinhas de série, mas a surpresa do último episódio me fez dar esse conselho, não vai se arrepender. Ele responde questões que não necessariamente precisavam ser respondidas, mas que fazem parte de toda a grande mensagem clichê, brega e bonita que nos mantém levemente sãos: After the hurricane comes de rainbow. E esse momento, putz, a tempestade com sol me atingiu.
Tenho algumas críticas, a principal é: tem, sim, atores negros e diversidade mas, por que eles sempre são coadjuvantes? Sei que a série é baseada nas crônicas e, talvez, o volume de casos heterossexuais e de pessoa branca seja predominante (ou assim eles inferiram), mas, sei lá, acho que podia rolar um esforço maior em colocar LGBTs e negros mais no protagonismo em certas ocasiões. Uma vez que começamos a reparar e pesquisar esse tipo de coisa, uma chave vira dentro de nós e o automático começa a incomodar. Bem, me incomodou um pouco … notei que se preocuparam com isso, mas se rolar próxima temporada pode melhorar.
A verdade é que nós somos clichês, e queremos viver alguns momentos bregas. Eu quero conhecer Nova York e fazer o cronograma de turista iludida que mencionei no início, me embrenhar na lotada e barulhenta Times Square e viver as vergonhas e perrengues que me perseguem e fazem parte de qualquer experiência. Com o amor é igual, o plano sempre é interrompido por imprevistos, o lugar lindo na foto pode ser um horror na realidade, a gente se perde, mas se encontra também. O amor é ser turista no outro, seja uma amiga, um romance, um estranho, seu porteiro ou você mesma.
PS: Mais uma produção da Amazon Prime Video excelente. Oficialmente meu streaming favorito na categoria ~originais.