Como uma série sobre startup nos anos cinquenta coleciona vários prêmios, entre eles alguns Emmys e Golden Globes? Nos cinco primeiros minutos da trama você já irá ter boa parte dessas respostas! Conquistar o público é um talento natural para Mrs. Maisel, sendo impossível não se envolver com o acontecimento que é essa mulher – ficando apreensivo com suas cagadas e admirados com sua petulância.
Começamos essa jornada com o surgimento de Mrs. Maisel: O casamento de Miriam Weissman (Rachel Brosnahan) e Joel Maisel (Michael Zegen). Durante o discurso de Midge, para os íntimos, vamos conhecendo a história do jovem casal, sua vida atual com filhos e, principalmente, a personalidade da protagonista. Ambas famílias são judias, relativamente ricas, que moram em uma Nova York do final da década de 1950. O sonho de Joel é ser comediante de standup, mas enquanto não chega lá, é vice-presidente na empresa do tio – um trabalho que odeia. Midge Maisel é dona de casa, fazendo de tudo para ser a esposa perfeita e apoiar o marido – inclusive conseguindo ótimos horários para ele se apresentar no bar local. Porém, após uma briga com o dito cujo, sua vida vira de cabeça para baixo, e Midge mergulha numa jornada de autoconhecimento e começa a traçar seus próprios rumos.
Primeiramente, odeio standup! Tendo esclarecido esse ponto, o próximo é dizer que lendo a sinopse, a série não parece lá muito interessante, né? E agora você deve estar se perguntando: essa pessoa gostou ou não desse raio de série? Bem, eu AMEI a primeira temporada, e aqui vão os principais pontos que conquistaram meu coração:
7. É uma série de Dramédia com muita ironia: Como disse acima, a trama é sobre a comédia standup, então os momentos mais engraçados não provem do show em si, mas das confusões de Mrs. Maisel. Além disso, ela possui uma narrativa muito ácida, cheia de referências e deboches, o que não traz altas gargalhadas, porém é extremamente engraçado. É uma mistura de humor intelectual com piadas espontâneas e ensaiadas.
6. A história é realmente boa: apesar de cada episódio ter quase 1 hora, é um tempo que você não vê passar, pois são dinâmicos e acontece muita coisa. Os diálogos são muito bem desenvolvidos e chegam a lembrar os textos de Aaron Sorkin (Rede Social) – não são naturais, mas são dolorosamente bons haha. A trama não tem barriga e os 8 episódios da primeira temporada fecham perfeitamente um ciclo e deixam o gancho para o próximo. E, o principal de tudo, foi criada por uma mulher, Amy Sherman-Palladino, que também foi responsável por Gilmore Girls! GIRLS SUPPORT GIRLS
5. Direção de arte: premiada pelo seu figurino, a série remonta os anos cinquenta com perfeição. As roupas, a loja de departamento, os costumes, tudo ajuda a contar muito da história e mergulha o expectador numa Nova York que ficou lá trás. A cidade é personagem da série, e com sutis inserções é possível conhecer um pouco da vida na maior metrópole do mundo na época. Toda a ambientação é um show à parte, e temos os vinis, a cultura de consumo de standup (que eu desconhecia), os trabalhos e os hábitos sociais e domésticos das famílias.
4. Midge é uma judia rebelde: Imagina uma pessoa debochada e travessa – Essa é Miriam! Pensando por cima, eu não lembro de nenhuma história na qual a personagem principal fosse judia, e isso foi realmente abordado na série. Desde os costumes, a interação com a família e com a sociedade, as roupas, tudo engloba é cultura dos Weissman e Maisel. É diferente e um contato com uma perspectiva nova que não havia tido com o judaísmo, mesmo que de forma sutil. E o melhor de tudo é Mrs. Maisel usando essa bagagem como instrumento de piadas haha
3. Os personagens coadjuvantes: sem exceção, todos são geniais! A protagonista não conseguiria brilhar se não tivesse um elenco excelente de suporte e acompanhando seu ritmo. Os pais de Midge, Abe (Tony Shalhoub) e Rose (Marin Hinkle) são sensacionais, e não passa uma cena com um dos dois sem que me divirta horrores. Mas a melhor parceria e contraponto para Miriam é a maravilhosa Susie Myerson (Alex Borstein), além de amar o trabalho da atriz, ela consegue com louvor transitar entre tons sérios e cômicos. Todo o elenco tem uma sintonia especial, entendem o texto e conseguem transmiti-lo com verdade e nuances impecáveis – não a toa ganhou até Critics Choice Awards.
2. A própria Midge: Não é à toa que a personagem nomeia a série, ela é realmente extraordinária. Rachel Brosnahan tem um timing cômico perfeito e consegue criar profundidade e nuances que fazem com a protagonista fuja do caricato. O crescimento de Mrs. Maisel é nítido e impossível não torcer e se orgulhar da personagem – e querer dar umas bofetadas nela também. Midge é magnética, tem uma personalidade bem acentuada e conseguimos enxergar os conflitos da personagem sem a necessidade de texto expositivo. A vontade é de ser sua amiga e embarcar junto nas maiores loucuras, pois, apesar de se passar em uma realidade distante da nossa, ela é muito gente como a gente (com macho atrasa vida e tudo).
1. Girl Power!! A razão de ser da série é mostrar a reconexão de Midge com seu eu verdadeiro, se conhecer e se permitir. Ela foi criada como uma mulher perfeita, esposa, mãe, sempre dedicada as necessidades da família e sob um padrão de beleza doentio. Apesar de sempre possuir um ímpeto rebelde, ela acabava dentro da caixa, até ser deixada pelo marido. Você pode imaginar que, em 1958, o divórcio não era algo bem visto, especialmente em famílias tradicionais e religiosas. E a cada episódio vemos uma Midge descobrindo suas aptidões, enxergando seu talento, buscando recomeçar sua vida, questionando sua tal “vocação materna” e usando tudo isso como ingrediente para seus brilhantes e inesperados standups. Uma série que com muito humor, deboche e ironia traz discussões ácidas sobre feminismo e o papel da mulher na sociedade.
Em contraponto com essas 7 razões encantadoras de Marvelous Mrs. Maisel, como dá para inferir das descrições acima, a série é pura classe média sofre haha. Midge é mega privilegiada e os perrengues dela não são, de longe, problemas realmente graves e muitas pessoas a ajudam – em parte pela persuasão da personagem, em parte por facilitadores de roteiro mesmo. Isso leva a cenas que não tem lá muita verossimilhança, e a soluções mágicas e fáceis para as coisas – um mundo gentil, colocamos dessa forma.
Além de tudo, existe também a questão da não representatividade na série que segue o padrão da época com zero negros, zero gordos, zero LGBT e zero pobres. O mais próximo que chegamos desses elementos são a personagem de Susie que é pobre, mas isso não chega a ser uma grande questão ou é explorado. Outra personagem, a única negra, é Harriet (Wakeema Hollis) que apenas ocupa a posição de vendedora da loja de departamento que, se tem três falas é muito. Não faz sentido essa personagem e chega a ser meio ofensivo. São questões compreensíveis para a época, o recorte social escolhido e tudo, mas né, gente, meio chato haha. Uma verdade que ficou muito clara, para mim, foi o total feminismo branco – não é demérito, mas sempre bom estar atenta a esses fatores.
Não poderia terminar de falar dessa série sem mencionar Nataly – a responsável por esse design maravilhoso do blog e quem está morando em Manhattan e meio que tem tudo a ver com Mrs. Maisel! Amiga, essa indicação é especialmente para você e eu senti um calor no coração assistindo e vendo um pouquinho de você ali e aqui haha. The Marvelous Mrs. Maisel ganhou os prêmios mais importantes no universo das séries de comédias, conta com duas temporadas (preciso assistir a segunda) e está disponível no Amazon Prime Video. Uma série divertida, assertiva, que cutuca a sociedade tradicional e traz com perfeição a vibe de 1958 – assistam e me agradeçam depois haha.