Lara Jean – a heroína que precisávamos

O novo romance teen da Netflix chegou para mostrar uma outra maneira de contar velhas histórias. Ele evidencia o quanto estávamos carentes de protagonistas diferentes, bem construídas e com relacionamentos complexos. Escorrega pontualmente, mas ainda assim passa a sensação de conforto e alegriazinha.

Eu tenho momentos com comédia romântica. Durante a adolescência, eu vivia desse gênero, até que chegou um momento onde ele não fazia mais sentido para mim e não me via neles – tudo era genérico e repetitivo – então entrei mais ou menos em hiatos de filmes assim. Entretanto, apesar dos vastos problemas que encontramos neles – desde mensagem até estrutura mesmo -, a verdade é que minha Thais interior AMA UM HIGH SCHOOL ROM-COM (romantic comedy, aprendi o “termo” essa semana e estou gastando haha). Assim, fui com uma expectativa alta, mas dúbia, assistir a Para Todos Garotos que Já Amei, e, gente, ele é um cristal do gênero!

O longa é uma adaptação do livro homônimo de Jenny Han e a história é simples – e até um clichê gostosinho do gênero. Nela vamos acompanhar Lara Jean, uma adolescente de 16 anos, filha do meio de três irmãs as quais moram com o pai viúvo. Super romântica e introvertida, Lara Jean nunca teve um namorado, e, sempre que tem uma paixonite forte em alguém escreve uma carta que nunca tem a intenção de entregar, elas somam 5 e ficam escondidas em seu quarto. Até que, um belo dia, as cartas são “misteriosamente” enviadas aos destinatários. Na lista temos Josh (Israel Broussard), vizinho e ex-namorado da irmã mais velha, e Peter (Noah Centineo), ex-namorado há um dia da ex melhor amiga que agora é super popular. A, até então, inexistente vida amorosa de Lara Jean começa a se complicar, ainda mais com a ideia de engatar num namoro de mentira com Peter – cada um com seu próprio objetivo. Como eu disse, nada novo sob o sol … ainda.

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O que torna Para Todos Garotos que Já Amei especial é, primeiro, o desenvolvimento da personagem principal. Lara Jean não é um estereótipo, é alguém que poderia existir no mundo real e isso facilita muito a conexão com a protagonista e os seus dramas. Ela é introvertida e, como alguém que também é, posso afirmar que essa foi uma das raras vezes em que vi o assunto ser trabalhado de uma forma honesta e sensível. Normalmente, o personagem introvertido dos filmes é esquisito, excessivamente atrapalhado, motivo de piada, excluído, ou alguém que não conheceu a pessoa certa. Lara Jean não é nenhuma dessas opções, e isso me fez me sentir confortável, aceita e representada.

Além disso, nossa heroína vive com a cara nos livros, lendo romances e fantasiando essa vida para si, só que, ao mesmo tempo, ela não se permite viver o amor. Lara Jean é muito reservada, e mantem seus sentimentos guardados às sete chaves – ela tem grande dificuldade em deixar as pessoas entrarem, e a explicação é plausível e uma parte grande de sua personalidade. Eu acredito que sempre é rico em história quando você se utiliza do background do personagem de uma forma complexa e profunda – porque fica parecido com a forma como as pessoas se comportam e lidam com sentimentos na vida real. E essa característica não diz só sobre relacionamentos amorosos, mas sobre a forma como ela se comporta em família.

Uma das coisas mais importantes que identifiquei na história é que Lara Jean não precisa abrir mão de suas crenças, de sua personalidade e nem da sua verdade própria para crescer e ter um final feliz. A personagem passa por uma transformação, como esperamos em filmes adolescentes, mas ela não muda sua essência, ela não vira outra pessoa que é “socialmente estabelecida como a forma correta de ser”. Lara Jean permanece Lara Jean, só que um pouco mais madura. E o mais legal disso tudo é que ela é a única responsável pela sua felicidade, não existe isso de vítima (graças a Deus, melhore decisão não espalhar a história das cartas pela escola). Ela precisa superar suas barreiras e aprender a lidar com as mudanças repentinas que aconteceram em sua vida – Lara Jean enfrenta as adiversidades e as usa a seu favor.

Por fim, encerrando assunto Lara Jean, temos uma protagonista asiática, e isso em termos de representatividade é muito rico e importante – dar lugar para as várias meninas que nunca se veem devidamente retratadas nos filmes, especialmente como protagonistas. Sua etnia, para Lara Jean, é muito importante pois é uma conexão com a falecida mãe, então é uma forma de se sentir próxima a ela, e isso fica claro por meio da culinária. Além disso, Lara Jean é muito autêntica com sua personalidade e modo de se vestir (gente, roupa é muito importante e uma das maiores formas de nos expressarmos, ok? Nada fútil!). Ela é uma heroína importante pela sua personalidade, convicção e representatividade – e percebem como estávamos MUITO carentes de filmes rom-com protagonizados por uma mulher segura que não precisa se provar para ninguém? Isso na adolescência é um presente!

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Por isso digo que Lara Jean é mais do que a protagonista, ela é a alma do filme. Mas os personagens secundários também merecem atenção. O roteiro faz um ótimo trabalho em cria-los de forma que não sejam apenas impressões da protagonista a cerca daquelas pessoas. O que quero dizer é que nenhum personagem é muleta de Lara Jean e nem tem sua personalidade moldada pelos seus olhos. O romance da protagonista não é o foco das outras relações, existe vida além dele, e é isso que enriquece os relacionamentos. (Parênteses para enaltecer a amizade de L.J. e Chris que não se abalada e nem é afastada por conta de macho) (outro parênteses para a família que não abordei, mas é um dos pontos altos do filme, são incríveis).

O que faz a história fluir é o romance entre Lara Jean e Peter (mesmo que de mentirinha – porque só em hollywood isso deve acontece haha), e isso se dá graças ao desenvolvimento dos personagens e as atuações. Peter tinha tudo para ser o galã babaca típico – e eu receava isso durante boa parte do filme, mas não. Apesar de ser atleta, popular e começar esse romance para querer fazer ciúmes na ex, ele logo se mostra alguém reservado, mas vulnerável. Noah consegue transmitir essa vulnerabilidade com delicadeza e sinceridade, e isso faz com que o personagem fique crível e sensível. Peter é empático com a protagonista, escuta sobre seus sentimentos, trocam experiências, e tem conversas sérias no meio de brincadeiras. A relação que os dois constroem transparece verdade, e isso se deve tanto pela química do casal quanto pelos diálogos bem escritos (ainda posso ter quedinha por personagens high-school?).

Único ponto que eu não curti: a relação de L.J. com Gen, a ex melhor amiga. A menina é muito retratada como a vilã do filme, ela não tem nuances e nem motivações. Não é nos dada a oportunidade de conhecermos essa pessoa, nem o relacionamento dela com Peter, então não podemos ter empatia por ela. Achei essa briga de garotas por causa de macho meio desserviço – e o arco de Gen não faz sentido. Ponto adjacente a esse que também me incomodou foi o fato de o filme abrir uma brecha de discutir vazamento de fotos intimas, mas isso ser resolvido de forma natural e banal. Um assunto sério como esse foi usado meio como artificio para algo acontecer e não gostei, achei que não precisava por se não ia discutir.

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Além do roteiro, a direção também merece destaque. Susan Johnson conseguiu criar uma atmosfera contemporânea e bem “teen” para o filme. É incrível o trabalho realizado junto com Lana Condor – que tem uma atuação ótima digna de nova ídolo teen – na demonstração visual da evolução de Lara Jean. O filme tem uma carinha de baixo orçamento com filtro do instagram que deixa tudo meio indie e especial – é como se tivesse uma pitada do mundo fantasioso da protagonista no mundo real. As inclusões de Voice Overs e fashbacks são dinâmicas e divertidas, e o timing que a diretora tem para esses recursos é muito bom. Fora os enquadramentos que são muito bem planejados e bonitos!

Enfim, me surpreendi muito com Para Todos Garotos que Já Amei que entrega uma história previsível, mas com uma jornada rica e surpreendente. É um filme quentinho no coração, leve, divertido e perfeito para momentos de espairecer no sofá com um chocolate quente e cobertozinho. Lara Jean é uma personagem complexa e importante, tanto na representatividade asiática quanto na forma como é desenvolvida.

Agora preciso urgente ler a trilogia de livros que, depois de assistir ao filme, não entendi porque adiei tanto esse momento – a história não poderia ser mais minha cara haha.

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5 respostas para “Lara Jean – a heroína que precisávamos”

  1. […] Também já falei dele aqui no blog, e,  é uma óbvia indicação, eu sei. Ele é meu confort movie, e sempre que estou triste, desmotivada, desiludida, chorando, o coloco para assistir e tudo fica melhor. É um filme fofura, com uma personagem feminina incrível, e que consegue construir uma identidade única e singular no meio de tanta coisa igual. Ele é muito carinhoso, meigo, com uma história diferentinha e não vejo grandes problemas, só uma imensa vontade de aperta haha. Lana Condor é perfeita, e, junto com Peter Kavrinsky (Noah Centineo), nos apaixonamos por ela. É a sensação de esperar uma coisa louca acontecer na sua vida e virar tudo de cabeça para baixo (mas que, na real, não ocorre nunca haha). […]

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